9. Histórias da quarentena: a dor






9.    Histórias da quarentena: a dor

Acordei de madrugada sem ar. Respirava com dificuldade, como se estivesse me afogando na secura dos meus pulmões.

Fiquei assustado. Coronavírus? Levantei, fui para a sala, recostei no sofá. Sorvia o ar com força, não adiantava. Dor no peito, diafragma comprimido, queimação nos pulmões. Mil coisas passando pela cabeça. Uma secura infinita, como se respirasse areia, ar quente, zero oxigênio. Um peixe fora d’água. Será? Peguei? Que azar. Pensei na família, minha mulher, meus filhos. Pensei nas pessoas com as quais convivo. Se peguei, eles pegaram? De mim? De cabeça, enumerei os sintomas da Covid-19, dos mais leves (febre, tosse seca, cansaço) aos mais pesados (dificuldade de respirar, dor ou pressão no peito, perda da fala ou dos movimentos). Não tive febre, nem tosse, muito menos cansaço. Mas, a cada respirada, mais dificuldades. Meu peito era uma mina escura, sem ar. Quanto tempo levou? Não sei. O tempo ia, voltava. Estiquei o pescoço, levantei a cabeça na esperança de respirar melhor. Nada. Pensei em acordar a minha mulher, mas não. Queria entender, primeiro, o que estava acontecendo. A secura extrema me fez levantar e beber água. Muita água. Fez bem. Aos poucos, a respiração foi se normalizando, a dor foi ficando apenas uma lembrança severa, mas lembrança. Adormeci, sem sentir. Acordei no início da manhã, com a luz do sol. Sem dor. Sem febre. Sem tosse. Sem cansaço. Respirei, o ar entrou como um vento minuano e inflou os pulmões. Velas ao vento. Sem dificuldade alguma. O que terá acontecido durante a madrugada? Ataque de pânico? Estresse? Sonho? Caprichei nos cuidados de saúde, reforcei a alimentação, passei a beber dois litros de água por dia, procurei um médico amigo, fiquei em casa. Semanas e semanas depois, é a primeira vez que falo desse episódio. Ele nunca mais se repetiu. Ataque de pânico? Estresse? Sonho?


Segue o baile ...

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