Somos um país egoísta?



por Marcos Meirelles

Fui abordado, esta semana, por dois usuários de droga que pediam dinheiro em Paraty. 
Não é uma situação comum na cidade e pode ter relação com o fluxo de turismo da temporada, o que aumenta as demandas e pressões do entorno.

Os episódios me fizeram comparar, no entanto, com a realidade de São José, onde a cidade naturalizou nos últimos anos as situações de degradação social, especialmente aquelas associadas ao consumo de drogas.

Dois usuários de crack vivem nas cercanias da minha rua em São José. São pessoas inofensivas e já são tratados até como parte do folclore local: o Moedinha e o Zupira. Mas são solenemente ignorados pela Saúde e Assistência Pública.

Apesar de seus surtos, no entanto, Moedinha e Zupira estão relativamente bem. Se você passar pela esquina do Vicentina Aranha, um quarteirão adiante, verá usuários que estão praticamente em pele e osso.

Não vou nem discutir de quem é a responsabilidade governamental. Porque o buraco é mais embaixo. O buraco é o que pensa cada 'cidadão alto padrão', aquele que sonha em ter uma réplica de Bolsonaro no Paço Municipal cuidando da limpeza étnica necessária para preservar sua rotina 'cidadã' e seus passeios com dogs, patinetes e SUVs.

Governantes são o retrato de seu povo. 

O Brasil ignorante e egoísta de hoje reafirma a sábia lição do filósofo francês. Somos um país de ignorantes e de gente de pouca leitura e isso foi potencializado, ao extremo, pelo processo de bestialização dos smartphones e redes sociais.

Neste cenário, para ter sucesso, é fundamental que os governantes alinhados com seus eleitores rendam tributos diários à banca e ao agronegócio, que sustentam economicamente a boçalidade da nação, enquanto milhares são entregues à miséria e à degradação social.

É preciso também cultivar um verniz popularesco, aquele lado caipira (ou sertanejo, pois parece mais apropriado) que nos remete ao nosso passado escravocrata, machista e colonial. 
Por isso, nada mais conveniente que o convite para que a ex-namoradinha do Brasil assuma o comando da Cultura, enaltecendo assim a nossa falta de cultura.

Marcos Meirelles é jornalista.
Este artigo foi publicado originalmente no jornal "O Vale"

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