A raiz quadrada de três

Maquete virtual da Ponte Estaiada

O prefeito Felício Ramuth (PSDB) convocou uma entrevista coletiva semanas atrás para provar, por A + B, que a Ponte Estaiada foi paga com recursos do BID e não com verba do Orçamento de São José dos Campos. Após 20 minutos de explicações, Felício provou exatamente o contrário: os recursos vieram do Orçamento. Com ajuda do BID, sim, mas, com recursos do Orçamento.

Como assim?

O enredo oficial, seguido por Felício, se baseia em uma reengenharia financeira, feita com a simpatia do BID e uma espécie de contabilidade criativa, construída pelo secretário de Finanças, José de Mello Corrêa, e sua equipe. Com a Ponte Estaiada excluída, em setembro de 2019, do contrato com a prefeitura (isso é fato, este documentado e Felício admite), o BID abriu a possibilidade de o governo identificar outras despesas que pudessem ser colocadas sob o “guarda-chuva” do acordo. Pagamentos já executados pelo município, como a desapropriação da Via Cambuí e a obra da Via Oeste, foram “encaixados” no contrato e reembolsados pelo BID à prefeitura, equilibrando a coluna entre “haver” e “dever”. Conta de armazém. Estimado em R$ 57,4 milhões, esse dinheiro vai ser usado para pagar a ponte, jura Felício. Noves fora, é, no entanto, dinheiro do Orçamento, devolvido ao município graças a um acordo de compensação.

É louvável o esforço para não deixar a verba do BID escapar. Afinal,  é muito dinheiro e dinheiro, como todo mundo sabe, não nasce em árvore.

Por menos, muito menos, o governo Carlinhos Almeida (PT) desistiu da Via Banhado. Uma pena. Agora, contra o relógio (o contrato vencia em dezembro), a opção foi positiva. Sobre a contabilidade criativa, ela será analisada pelo Tribunal de Consta do Estado. Se passar pelo crivo do TCE, tudo bem. A pulga coça atrás da orelha, no entanto, por um detalhe: ora bolas, a ponte foi excluída do contrato em setembro de 2019, mas o governo só tornou isso público agora, em janeiro de 2020, após ser colocado contra a parede. Ué, por quê? Não teve “live”, release, comunicado oficial.  Era para ficar em segredo? Não deu certo, cara-pálida. Felício até esboçou uma resposta, meio sem sal: segundo ele, esse detalhe não interfere na vida do cidadão. Aí não, professor. Transparência sobre atos e informações públicas não é só exigência legal, mas, sim, compromisso moral do gestor público e, mais, direito do cidadão. Resumindo, transparência não é favor feito quando dá na telha do gestor, é obrigação. Obrigação, repito.

Felício gosta de números. É válido. Racionais ou irracionais, eles são lógicos. Mas, ao driblar o princípio da transparência, o prefeito errou no cálculo. Quis provar a quadratura do círculo e isso --a gente aprende na escola, uma aula depois da raiz quadrada de três-- é uma tarefa impossível. Mais: tal postura lança uma sombra sobre os atos do governo. Afinal, frente a outras tantas obras e licitações, como a Linha Verde, por exemplo, que outros “detalhes” Felício não divulga ou lembra de contar em suas “lives” por achar que eles não interferem na vida do cidadão e não precisam ser, necessariamente, conhecidos?

Essa é uma matemática perigosa. Nela, algumas vezes dois e dois são cinco.

PS: Este artigo foi publicado originalmente na edição do jornal "O Vale" do último final de semana 

Comentários

  1. Adivinhem por que o prefeito Felício quer mexer na aposentadoria do servidor municipal?

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  2. E o que é pior: toda esta falta de transparência para uma obra que NÃO resolverá o trânsito na rotatória do Colinas. Pensem (e façam contas): são 16 rotas possíveis na rotatória e a ponte apenas "resolve" duas. Sim, 2 de 16! Duas rotas que não são as mais congestionadas. Com o novo zoneamento e uma possível verticalização no terreno das "vaquinhas", as operações da EDP e do novo colégio Planck na Av. Cassiano Ricardo, a retirada da conversão em torno do Shopping Colinas, preparem-se para um cenário de trânsito complicado. Para os bajuladores de plantão, não importa mais nada, afinal agora têm uma ponte estaiada!!!

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  3. Falta muita transparente, em meio a tanta obsessão por ter a ponte. Pois: Vc mora em SJC! Seus problemas acabaram. Não se preocupem com mais nada. Afinal vc tem uma ponte estaiada

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