Epidemia Ideológica



Em sua cruzada contra o Inpe, o presidente Jair Bolsonaro decidiu embargar os dados sobre desmatamento no Brasil sob um argumento curioso. Segundo o presidente da República, a divulgação de dados oficiais mostrando um aumento alarmante do desmatamento prejudica a imagem do Brasil no exterior.

Trata-se de um raciocínio enviesado.

É como culpar o carteiro pela carta de cobrança. O que pode prejudicar (e prejudica) a imagem do Brasil no exterior é o aumento crescente do desmatamento na Amazônia Legal, não a sua simples divulgação. Não falar de um fato transforma a realidade de modo positivo? Por essa linha de raciocínio, bastaria a imprensa deixar de publicar notícias sobre corrupção para o Brasil virar o país das maravilhas? Ou fechar as editorias de Polícia para a criminalidade cair a padrões suíços? Censurar a divulgação de dados oficiais sobre desmatamento ou sobre a fome no Brasil, com o argumento que o presidente não pode ser pego de “calças curtas”, vai nos transformar em um país melhor? A lógica é essa? Notícia ruim é melhor não saber?

Com essa atitude, Bolsonaro revela sua matriz ideológica, calcada nos governos da Ditadura Militar.

Pois é, nos anos 70, no auge da Dutadura, o Estado de São Paulo viveu uma epidemia de meningite, que provocou muitas mortes. A doença começou a mostrar sua face em 1971, durante o governo Garrastazu Médici, na mesma época em que o Brasil vivia ainda os reflexos do chamado “milagre econômico”, e atingiu seu ápice em 1974. Na cidade de São Paulo foram registradas mis de 900 mortes. O Vale do Paraíba foi uma das regiões mais atingidas pela doença. A Santa Casa de Tremembé foi transformada em QG contra a epidemia. No auge da doença, o Exército assumiu o controle de uma campanha de vacinação em massa. Uma campanha tratada como secreta: ninguém recebia comprovação da vacina, nem houve registro formal de número de vacinados. 
Para o governo militar, a eclosão da doença era vista como um fracasso do regime. Como explicar a epidemia? Qual o impacto dela na imagem do Brasil no exterior? Os áulicos da Ditadura não pensaram duas vezes: impuseram censura sobre a epidemia e esconderam a meningite da população. Divulgar alertas sobre como se prevenir da doença? Informar a população sobre riscos? Usar a máquina de propaganda do Regime para alertar a sociedade? Nem pensar. Para a Ditadura, o melhor remédio era o silêncio.

Não é possível calcular quantas mortes poderiam ser evitadas com medidas simples de prevenção. Mas a censura sobre a meningite entrou para a história do Brasil como um dos exemplos da miopia do Regime Militar. Bolsonaro, que admite ter saudades da Ditadura, está querendo mergulhar o país na escuridão?

Segue o baile …

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