Onde você estará no dia 28?

Com a cara do Brasil


“Você é ladrão ou é racista?”, pergunta Murilo Couto, em um vídeo que circulou dias atrás pelas redes sociais.

Essa foi a forma que o humorista de 30 anos, nascido em Belém do Pará, encontrou para explicar o dilema que aparentemente se impõe ao eleitor brasileiro neste segundo turno: votar em Fernando Haddad e toda a carga de problemas e ladroagem que vem com ele e o PT de Luiz Inácio Lula da Silva ou votar em Jair Bolsonaro e o caminhão de preconceitos, baboseiras, truculência e desvios éticos e humanistas que carrega sua candidatura a bordo do PSL, sigla de aluguel que aceitou acolhê-lo nestas eleições? Na dúvida, frente ao eleitor que não quer nem um, nem outro, Murilo é visceral: “Mas se fosse para ser, o que você seria: ladrão ou racista?”

Dita assim, a afirmação é simplista.

Claro que a grande maioria dos eleitores de Bolsonaro e Haddad nestas eleições não é nem uma coisa, nem outra. No geral, o brasileiro que vai às urnas quer uma vida melhor, não habita uma extremidade ou outra das trincheiras ideológicas que trocam tiros nestas eleições. Mas a piada de Murilo é fiel ao debate simplista de ideias e projetos que pautou esta campanha. Bolsonaro e Haddad, noves fora, falaram a um país inexistente, de convertidos, quando falaram. O Mito, como é chamado por seus aliados, preferiu ser um meme nas redes sociais a dizer, seriamente, a que veio. Haddad patinou, sem fazer a mea culpa necessária que o PT tanto deve ao país.

Olhando a biografia de ambos, no entanto, Bolsonaro chama mais atenção, principalmente pelo risco real dele assumir a Presidência da República a partir de janeiro.

Deputado fraco em 27 anos de mandatos sucessivos, sem ter uma ideia digna de crédito sequer na Câmara Federal, adepto do baixo clero e do come-dorme-veste-viaja pago com o dinheiro público (os dados são oficiais, não são fake news), Bolsonaro teve o tino de identificar o anseio por mudanças do eleitorado. Representante da velha política, surgiu travestido no papel de salvador da pátria, trazendo na ponta da língua um discurso debochado contra negros, mulheres, população LGBT e demais minorias, além de uma defesa intransigente da violência como estratégia política. A ponto de ter como ídolo o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que, no papel de Doutor Tibiriça, comandou o em São Paulo o principal centro de torturas existente nos porões da Ditadura Militar. Ustra, apesar na insistente negativa dos aliados da nova direita, foi o primeiro militar condenado pela Justiça Brasileira pela prática de tortura durante aos Anos de Chumbo (é história, não é fake news). Sem falsas polêmicas, ele é réu confesso, autor de dois livros autobiográficos, “Rompendo o Silêncio” e “A Verdade Sufocada”, nos quais está a raiz do discurso tacanho de Bolsonaro de que a Ditadura matou pouca gente (só 500 pessoas, nos cálculos de Ustra, contra muito mais na Argentina ou no Chile, como se houvesse um Campeonato Sul-Americano de Extermínio a ser disputado).

Um amigo meu, tucano, que desceu do muro neste segundo turno do lado de Bolsonaro, acredita que o Capitão Brucutu é apenas um personagem e que o Mito vai se amoldar ao assumir a Presidência. Será? Tenho dúvidas.

Pelo sim, pelo não, independe de quem ganhar em 27 de outubro, já sei onde eu estarei daí em diante: sempre torcendo e trabalhando pelo Brasil, mas sempre do lado da democracia, da liberdade de expressão, dos direitos individuais e do livre mercado. Não acredito na truculência como arma política. Aliás, repudio. E, como dizia Millôr Fernandes, jornalismo é oposição; o contrário é armazém de secos e molhados. Isto é, cabe a nós exercer o espírito crítico e fiscalizar o poder, seja ele qual for e por quem esteja ocupado, e não amplificar acriticamente versões e ideias alheias, muito menos se prestar a bajulador, como bem anotou Mário Magalhães, em um comentário recente sobre Millôr. Ladrão ou racista? Alheio a esse falso dilema (imposto quase como uma coação moral), já estou muito velho para ter medo de careta. Que venha o futuro e, com ele, os seus desafios.

E, se Deus é mesmo brasileiro, quem sabe o deputado do baixo clero vire, por milagre, um bom presidente. Será? Muita gente boa que eu conheço aposta nisso. E o país está esperando apenas uma lufada de vento favorável para voltar a crescer. Tomara que com paz social.

Ditadura nunca mais ...

Este artigo foi publicado originalmente na edição do jornal "O Vale" deste final de semana, em versão reduzida


Comentários

  1. Outra boa enquete...

    "Que tipo de ditadura você escolhe?"

    Claro que NENHUMA ... mas deixo aqui a minha opinião democrática...

    #ptnão
    #ptnuncamais

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