Moradia e injustiça

Vista geral do Pinheirinho dos Palmares

por Marcos Meirelles 
“Vamos celebrar a estupidez humana; vamos celebrar a aberração de toda a nossa falta de bom senso.”
(Renato Russo, Perfeição).
Depois do incêndio que destruiu o prédio do Largo do Paysandu, em São Paulo, a criminalização dos sem-teto era um movimento previsível.
Não importa se há mais de 160 mil famílias na fila da moradia, a maior cidade do país não pode tolerar que sua imagem esteja associada a hordas de sem-teto. Não importa se há centenas de prédios abandonados, esta ruína urbanística progressiva não incomoda os palacetes dos Jardins e os escritórios futurísticos do Itaim.
Enquanto cidades como Nova York promovem programas de recuperação e reocupação de prédios como ferramentas de acesso à moradia, São Paulo segue o seu destino estúpido de marginalizar a população mais pobre, empurrando-a para longínquos conjuntos habitacionais na periferia. E mesmo esta alternativa bizarra, reproduzida pelos governos desde a época da ditatura militar e do finado BNH, nunca é suficiente para atender à demanda por moradias.
Ninguém está interessado em discutir política habitacional, no entanto. O ex-prefeito que entregou o cargo para se dedicar ao marketing eleitoral já sentenciou: quem ocupa prédios é criminoso.
Assim, iniciou-se a caça aos supostos criminosos, antes mesmo que findasse a faina dos bombeiros em busca dos corpos perdidos nos escombros, gente quase sem identidade, tamanhos o descaso e a marginalização impostos pelo Poder Público.
Ao proselitismo dos políticos soma-se o ativismo persecutório da imprensa. Os telejornais, cenários esplêndidos para a exibição da estupidez humana, apressam-se a apontar culpados e a condenar, condenar, condenar...
Em vez disso, a tragédia de São Paulo deveria nos fazer repensar todas as nossas cidades e o que temos feito para equacionar a questão da moradia no país.
Mesmo o tão propagandeado Minha Casa, Minha Vida foi muito mais um estímulo à atividade econômica na construção civil do que, propriamente, uma ação planejada na área da habitação popular.
E este não é um problema apenas de São Paulo. Há uma gigantesca ocupação sem-teto em Jacareí e, em São José, a recalcitrante política ‘padrão BNH’. Como o Poder Público espera promover a qualidade de vida em bairros como o Pinheirinho dos Palmares, por exemplo?
Marcos Meirelles é jornalista.
Este artigo foi publicado originalmente na edição desde final de semana do jornal "O Vale"

Comentários

  1. Numa democracia capitalista não é obrigação do estado DAR moradia ao cidadão, como não é sua obrigação providenciar estacionamentos aos carrões de gente abastada. Não vejo e nunca vi discursos e, principalmente ações, em prol de uma real reforma da educação e cultura. Mais uma vez vejo aqui uma defesa oportunista de uma utopia; não adianta tomar remédio para passar a dor de cabeça...mas isso é só uma opinião.

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