A elite que arrota cultura

Anitta é decadência?


por Marcos Meirelles

Meu amigo Fábio França levantou a lebre de uma das mais badaladas notícias fake dos últimos dias. Uma suposta lista de melhores “artistas musicais” de 1987 que nossos supostos guardiães da cultura utilizam para denunciar a degradação da música brasileira, comparando-a aos campeões de audiência do Faustão em 2017.

Fábio afirma que a lista é “fake news” disfarçada de opinião.
Perfeito.

Os detratores de Anitta, Pablo Vittar e quejandos são os mesmos porta-vozes do saudosismo de araque que tece loas para a ditadura militar e glorifica o discurso neofascista de gente como Jair Bolsonaro.

É gente que julga ser papel da “elite” tutelar o povo e controlar até mesmo seus valores culturais, ignorando que, desde o tempo dos entrudos, o gosto popular, os lundus e os zé-pereiras, triunfam sobre as patéticas tentativas de tropicalizar óperas e árias.
A elite não suporta a “ignorância” do povão que vive no seu quintal ou na sua cozinha. O “historiador” Marco Antonio Villa escreveu, outro dia, que Anitta representa um inquestionável símbolo de “decadência cultural” e atacou a “idealização” da favela. Segundo ele, o país se transformou em recebedor “passivo” do que há de pior da cultura ocidental, especialmente a americana.

Ham?
Quer dizer que, em algum momento desde a chegada dos portugueses no país, não fomos recebedores passivos do lixo cultural europeu?

Com a multiplicação das plataformas digitais, há música para todos os gostos disponíveis no Brasil. Posso, pessoalmente, preferir outros estilos. Mas não posso usar a música para reproduzir, mas uma vez, a narrativa do preconceito (racial, social, de gênero ou qualquer que seja).

Quem acha que Caetano, Tom Jobim, João Gilberto e Chico são entidades sacrossantas da música brasileira deveria ler José Ramos Tinhorão. Sim, até de plágio ele os acusa...
Essa elite que arrota falsos passados culturais heroicos deveria se envergonhar, isto sim, da nossa marcha incivilizatória na educação e na saúde. Estamos aí, em pleno século 21, às voltas com uma nova epidemia de febre amarela. E nossas escolas públicas se tornam, cada vez mais, espaços privilegiados para a iniciação ao crime.


Este é o Brasil real, de ontem, de hoje e de sempre.

Marcos Meirelles é jornalista.
Este artigo foi publicado originalmente na edição de "O Vale" deste final de semana

Comentários

  1. Absurdo, oportunista e absolutamente simplista entender que, mesmo por eliminação simples e direta, que quem não "curte" Anitta e Pablo Vittar, necessariamente gosta, aprecia, bate palmas e idolatra gente como Caetano Veloso, Tom Jobim, João Gilberto, Chico Buarque e afins...Tanto isso é fato como é um erro, consumar que gosto diferente significa preconceito. A Bossa Nova é chata (MUITO)! a MPB dos festivais é utópica e beira a burrice, mas isso é só uma manifestação de gosto e nunca um preconceito. A Democracia, se existisse, deveria ensinar que deve-se minimamente ouvir as demais opiniões (as vezes isso é um problema). Coisas como Anitta e P.Vittar são ruins por si só, porque são letras(como?) preguiçosas direcionadas ao ínfimo exercício cerebral que aliás tem caracterizado o país inteiro. Pensar deve doer ou deve custar muito caro!...mas isso é só uma opinião...

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