Os jornais e a destruição criativa

Foto: Freepik

Uma análise de José Tadeu Gobbi


A situação da indústria do jornal impresso é desalentadora. Sua cadeia de valor foi comprometida, produção, geração e distribuição de informação pelo modelo de negócios da plataforma impressa perdeu sustentabilidade e administra uma situação de tempestade perfeita com a recessão e crise econômica acentuando os efeitos da revolução digital que desestruturou o seu mercado e comprometeu o caixa.
Toda cadeia produtiva do jornal atravessa uma crise sem paralelo, não há mais sentido ter grandes e modernos parques gráficos. O impressor perdeu o emprego, a indústria de máquinas impressoras precisa se reinventar, o fabricante de filme, de tinta, a indústria de reflorestamento, o fabricante de papel, de equipamentos de pré-impressão, a destruição de valor em toda cadeia produtiva é incomensurável.

Joseph Schumpeter em 1942 descreveu o fenômeno da destruição criadora na economia de mercado. Em apertada síntese se caracteriza por um processo que tira o mercado de seu equilíbrio com inovações em produção, produtos e serviços. A incorporação destas inovações provoca a substituição de produtos e serviços e gera novo ciclo econômico.
Se considerarmos que a indústria do jornal impresso passa por um processo de destruição criadora cabe avaliar quais inovações estão provocando sua substituição e o que esta surgindo em seu lugar.
É preciso constatar um paradoxo. Num contexto em que o mercado mais demanda e consome informação de qualidade a crise estrutural pela qual passa o impresso mostra-se anacrônica.
A busca de soluções como assinatura digital, paywall poroso e outras precisam de escala para serem sustentáveis. Num país onde a cultura da gratuidade na rede esta arraigada isto é um desafio hercúleo mesmo para grandes e consolidados grupos de comunicação. Os pequenos e médios mal conseguem respirar.
Até agora o efeito de redações desmanteladas, estruturas reduzidas, jornais que alucinadamente enxugam editorias, cadernos, suplementos ou encerram suas operações produzindo somente para o digital é transformar em arremedo o jornalismo de qualidade. O resultado é acelerar a migração do leitor para o ambiente digital mais amigável e interativo onde encontra informação gratuita.
Se as empresas de tecnologia, beneficiárias desta migração, não produzem uma linha sequer de conteúdo, apenas indexam o conteúdo produzido por empresas jornalísticas, como será o futuro da imprensa quando as grandes usinas de informação tiverem sucumbido à destruição criadora?
Neste cenário até as marcas tradicionais do jornalismo perdem força em função dos novos modelos de publicidade no digital. A mídia programática, por exemplo, alcança o consumidor onde ele estiver seja no portal da Folha ou navegando pelas páginas do canal de entretenimento Porta dos Fundos fragilizando as marcas geradoras de tráfego e audiência na rede.
Junto com a indústria do impresso também a função do jornalista entra na equação. O que fazer com a grande reserva de profissionais qualificados descartados neste novo ecossistema da informação? Serão substituídos, como o foram no passado os pastups, por um novo software? Alguma inteligência artificial vai ser programada para apurar, checar, refletir, opinar, processar, fazer a curadoria e distribuir informação pela rede? O bom senso nos induz a pensar que em algum momento serão engajados pela indústria de tecnologia que, quando não mais tiverem fontes para indexar, terão que produzir informação de qualidade. Terá sido concluído o processo de substituição, resultado da destruição criadora. Tai o exemplo Netflix que de distribuidor passou a ser também produtor de conteúdo.
A questão é mais abrangente e transcende a sobrevivência da indústria do jornal impresso ou o destino dos profissionais que a mantém nestes dias heroicos. O que esta em jogo é a redefinição, pela revolução tecnológica, do papel da imprensa na manutenção da democracia em sociedades modernas.

Este artigo foi publicado no Observatório da Imprensa, no dia 30/04/2016

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